Após vitória no Congresso, governo busca ampliar apoio a reformas
A fachada do Congresso Nacional Foto: Câmara dos Deputados/Divulgação
Apesar da eleição de aliados para comandar o Senado e a Câmara, o governo Bolsonaro tem consciência que precisará de uma articulação mais eficiente para a formação de uma base parlamentar ampla para a votação de propostas polêmicas e que alterem a Constituição , como a reforma da Previdência . Os tumultos na eleição de Davi Alcolumbre (DEM-AP) deixaram fraturas importantes no Senado, principalmente no grupo de Renan Calheiros (MDB-AL).
A eleição tranquila de Rodrigo Maia (DEM-RJ), por sua vez, é um mérito que o governo admite ser mais do parlamentar fluminense, que apoia as reformas, que do Planalto, tanto que aliados de Maia já traçam estratégias para aumentar o poder de barganha com o governo. A principal é esvaziar o poder do deputado novato Major Vitor Hugo (PSL-GO), escolhido pelo presidente como seu líder na Casa, atribuindo papel de interlocução com o Planalto ao líder da maioria, que ainda não foi escolhido.
Vista como uma vitória pessoal do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, a eleição de Alcolumbre no Senado deflagrou uma preocupação de integrantes do Palácio do Planalto sobre as dificuldades que o governo Jair Bolsonaro enfrentará com a oposição declarada de Renan Calheiros, desafeto de Onyx. O chefe da Casa Civil também é contestado por alguns parlamentares da base, inclusive do PSL de Bolsonaro.
Mesmo com a derrota, Renan, na visão de auxiliares do presidente, tem influência para definir as votações e atrapalhar a vida do governo. Parte da equipe do Executivo defendia, reservadamente, a vitória do emedebista para o comando da Casa, por considerar que ele teria mais instrumentos para garantir a aprovação da reforma da Previdência. Tanto que o ministro Paulo Guedes (Economia) se reuniu com Renan antes da eleição e nunca procurou Alcolumbre.
A desistência de Renan após o voto aberto de Flávio Bolsonaro, filho primogênito do presidente, foi entendida como um recado de que o governo não terá vida fácil. Aliados do pai consideraram uma “trapalhada” a atitude de Flávio, por empurrar o emedebista a ficar contra o governo.
MDB define estratégia
O MDB ainda vai discutir seus próximos passos em uma reunião na tarde de hoje (segunda-feira). A ideia é, primeiro, fazer a negociação de outros espaços na Casa antes de se posicionar sobre o governo. Um dos senadores que apoiaram o alagoano diz que a legenda, como maior bancada, quer espaço na Mesa Diretora e comandar a comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a principal da Casa. O grupo afirma que aceita negociar, mas adverte que, se Alcolumbre optar pelo isolamento do grupo de Renan, estará criado um problema para o governo.
Cotada para um cargo na Mesa ou a presidência de uma comissão importante, a senadora Simone Tebet (MS), que enfrentou Renan na bancada do MDB e saiu vitoriosa com o apoio a Alcolumbre, avalia que a eleição para a Presidência do Senado não é o termômetro ideal para sentir a força do governo no Senado.
— Havia ali um interesse específico, que era tirar o Renan. Há gente que votou em Davi e que não vota na reforma, necessariamente. Há gente que é governo e não gostaria de votar no Davi para não dar hegemonia ao DEM, mas votou com outro objetivo. Além disso, há muita gente nova que não vai necessariamente seguir o líder. Vai ser difícil ser líder nesse Congresso, avaliou Simone Tebet.
Aliado de Alcolumbre, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) reconhece a ajuda de Onyx, mas refuta a avaliação de interferência do governo na eleição.
— O Davi não era candidato do governo. O governo não tinha candidato. Agora, se você perguntar se o Onyx foi aliado do Davi? Claro que foi. O Onyx é amigo do Davi, mas o governo não operou nada, afirmou Marcos Rogério.
A vitória maiúscula de Rodrigo Maia na Câmara esconde insatisfações que começam a surgir na base aliada do governo. A falta de interlocução está presente na conversa de vários deputados, que reclamam da escolha do líder do governo. Major Vitor Hugo está em seu primeiro mandato e ainda na fase de se apresentar aos colegas. Alguns defendem que alguém com mais traquejo político comande as negociações.
Diante disso, o bloco que deu sustentação a Maia já discute internamente o nome do líder da maioria, cargo que foi criado há dois anos e, até então, tinha pouca importância. A ideia é nomear alguém capaz de concentrar as negociações com os principais partidos, esvaziando o poder de Vitor Hugo.
O governo está ciente da dificuldade. O ex-deputado Carlos Manato, secretário especial da Casa Civil para a Câmara, inclusive, pediu uma sala na Câmara para que possa despachar às terças e quartas, auxiliando na interlocução com os deputados. Com informações de O Globo.
Planalto quer negociar ‘no varejo’ com deputados
O Palácio do Planalto vai montar uma espécie de “posto avançado” na Câmara para atendimento dos deputados no varejo. Depois da eleição que deu vitória a Rodrigo Maia (DEM-RJ) para novo mandato à frente da Casa, o governo estabeleceu um cronograma para medir a temperatura do Congresso e evitar ser pego de surpresa com insatisfações de última hora em votações consideradas prioritárias pelo presidente Jair Bolsonaro, como a reforma da Previdência.
Com uma base aliada ainda em formação e após definir os 22 ministérios apenas sob indicação de frentes parlamentares, Bolsonaro foi aconselhado a criar algo semelhante a uma “ouvidoria” para tratar das demandas individualmente, aproveitando a retomada dos trabalhos legislativos, agora com um Congresso renovado. Das 35 metas traçadas para os primeiros cem dias de governo, que serão completados em 10 de abril, metade depende do sinal verde da Câmara e do Senado.
Nomeado nesta sexta-feira, 1.º, como titular da Secretaria Especial para a Câmara – cargo atrelado à Casa Civil –, o ex-deputado Carlos Manato (PSL-ES) será o encarregado de ouvir os antigos pares e os novatos, do alto ao baixo clero.
Ele não estará sozinho nessa missão: outros ex-deputados, como Victorio Galli Filho (PSL-MT), Fábio Sousa (PSDB-GO), Marcelo Delaroli (PR-RJ) e Laudivio Carvalho (PODE-MG), vão ocupar o gabinete da liderança do governo na Câmara.
“Quero botar um posto avançado lá, um apêndice para atender os deputados. Irei na Câmara às terças e quartas-feiras, das 16 às 17 horas”, afirmou Manato, que desde 2 de janeiro já despacha no 4.º andar do Planalto.
Candidato derrotado ao governo do Espírito Santo, em 2018, Manato integra o núcleo político que ajudará o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, nas negociações com o Congresso. Além dele, fazem parte do grupo os ex-deputados Leonardo Quintão (MDB-MG), na Subchefia de Assuntos Parlamentares, e Abelardo Lupion (DEM-PR), assessor especial de Onyx, juntamente com o ex-senador Paulo Bauer (PSDB-SC), que comandará a Secretaria Especial para o Senado.
Emendas
A Casa Civil tenta traçar com a equipe econômica um plano de pagamento das emendas parlamentares individuais, em dez parcelas de no mínimo R$ 750 milhões, o que totalizaria R$ 7,5 bilhões. Tradicionalmente destinadas aos redutos eleitorais dos congressistas, as emendas sempre funcionaram como moeda de troca em outros governos. O discurso do Planalto, porém, ainda é o de que nada será tratado na base do toma lá, dá cá.
“As emendas estão no Orçamento, são impositivas. Nós não vamos colocar nem aceitar faca no pescoço”, insistiu Manato. O ex-deputado disse que o governo quer “todo mundo bem tratado”, mas não fará barganha política para obter votos no Congresso. “Vamos trabalhar na base do diálogo, do convencimento e esperamos a franqueza quando um deputado não puder votar conosco. Não é por isso que vamos ficar de cara feia”, afirmou ele.
O Planalto faz esforço concentrado para aprovar, no primeiro semestre, a proposta de reforma da Previdência, considerada mais difícil, pois, por ser emenda constitucional, necessita do apoio de 308 deputados e 49 senadores, em duas votações. Na agenda do governo está ainda o pacote com medidas para combater a corrupção, que será apresentado nesta segunda-feira (04), aos governadores pelo ministro da Justiça e da Segurança, Sérgio Moro.
“Quero também que o ministro trate da segurança pública. As pessoas estão morrendo pelo absurdo que é o comando do tráfico de drogas e de armas em todos os Estados”, disse Maia, após ser reconduzido à presidência da Câmara. “Nós vamos construir um grande pacto no Brasil para aprovar as reformas e garantir condições mínimas para que os empresários voltem a investir aqui, mas espero que o governo trate também desse enfrentamento ao crime organizado.” Ele observou que já há projetos nesse sentido tramitando na Casa há um tempo. “Mandar outro para lá seria vaidade do próprio ministro”, provocou.
Ficha
Maia e Onyx não têm um bom relacionamento, embora sejam do mesmo partido, o DEM. O presidente da Câmara chegou mesmo a dizer que o chefe da Casa Civil trabalhou contra sua candidatura. Para se precaver de qualquer intriga, o ministro orientou Manato a ir para as conversas na Câmara municiado de dados.
O secretário de Onyx tem no computador a ficha completa dos 513 deputados – dos quais 243 são novos. “Sei quantos mandatos cada um teve ou não, se é médico, militar, professor e até sua atuação nas redes sociais”, comentou Manato.
Escolhido na última hora para apagar o incêndio em um Senado conflagrado, o tucano Paulo Bauer, por sua vez, disse que fará de tudo para abrir um canal direto dos parlamentares com Bolsonaro e com Onyx, após a vitória de Davi Alcolumbre (DEM-AP) naquela Casa.
“Não tenho caneta nem tinta”, avisou Bauer. “Temos, porém, condição de ouvir, acompanhar projetos, montar estratégias de trabalho e dar apoio aos pleitos dos senadores, levando as reivindicações deles para os diversos ministérios.”
Ao contrário de muitos integrantes do governo, Bauer avalia que o senador Renan Calheiros (MDB-AL), derrotado por Alcolumbre, não será o líder da oposição. “Renan já se reinventou várias vezes. Não custa se reinventar de novo”, argumentou.
A eleição no Senado, neste sábado, 2, foi marcada por bate-boca, xingamentos e até denúncias de fraude. Renan renunciou à candidatura quando a segunda votação já havia sido iniciada e percebeu que perderia. Suas últimas frases, porém, não deixam dúvidas de que o foco de sua trincheira, agora, estará na contramão do Planalto. “Você pode até tirar o velho Renan de cena, mas nunca matá-lo”, disse ele ao Estado.
No modelo original do núcleo político desenhado por Onyx, o ex-deputado Leonardo Quintão trataria do relacionamento com o Senado, mas, logo na largada, trombou com Renan. “Ele é um bom amigo, mas péssimo adversário” resumiu Quintão. O alagoano é conhecido no governo por guardar o ódio “encapsulado” e dar o troco. Por não conseguir se aproximar dos senadores, Quintão foi deslocado para outra pasta e agora vai cuidar da tramitação de emendas, medidas provisórias e projetos no Congresso.
Na retaguarda da Casa Civil, o ex-secretário de Infraestrutura e Logística do Paraná Abelardo Lupion terá uma tarefa mais interna no núcleo político de Onyx, de quem é compadre. Será dele a missão de acompanhar os pedidos de governadores e prefeitos, que também têm influência sobre o Congresso.
“Nós vamos ser o para-choque do governo”, resumiu Lupion. Ainda sem sala no Planalto, Lupion foi deputado por seis mandatos e é considerado habilidoso, tanto que acompanhou Alcolumbre no Senado, nos últimos dias. “O diabo é sábio porque é velho”, brinca ele, abrindo um sorriso. Antes de se despedir, porém, Lupion avisa que agirá sempre para “blindar” o Executivo. “O momento é crítico e não temos o direito de errar”, diz. Com informações do Estado de S.Paulo.
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