Política : NADA DE GOLPE
Enviado por alexandre em 14/05/2020 09:01:58

Bolsonaro não tem condições de dar um golpe

Por Ayrton Maciel*

Estimulados pelo presidente Jair Bolsonaro, em presença e dissimuladamente em falas, os atos públicos que pedem intervenção militar e o fechamento do Congresso e do STF deixam explícito o desejo de uma minoria radical de ter, no país, uma ditadura de direita.

Bolsonaro quer, mas não haverá golpe. Seus seguidores não terão um ditador. Não há - no país -condições nem circunstâncias, internas e externas, que lhe favoreçam a se arriscar numa aventura. Bolsonaro correria um grande risco de derrota e, por consequência, deposição e prisão, juntamente com militares e políticos apoiadores de um ataque à Constituição.

Que Bolsonaro tem o desejo de dar um golpe, que seus radicais “milicianos políticos” estimulam, que políticos extremados e de lobbies armados respaldariam e que alguns líderes e setores militares avalizariam o golpe, parecem óbvio e de indisfarçável vontade.

Entretanto, as condições e circunstâncias lhes são totalmente adversas para um ataque à democracia brasileira, mesmo que num gesto insano e de delírio coletivo de seus pares. Por quê?

1) Bolsonaro tem perdido sucessivo apoio na parcela eleitoral - particularmente na direita liberal - que votou nele em 2018. Essa parcela não tem prática nem simpatia política pelo fascismo, mas sim pelo liberalismo econômico e a vida democratiza;

2) Num momento de enfrentamento de uma dramática pandemia, a sua avaliação de desempenho é de reprovação pela maioria, e a avaliação da sua gestão é desfavorável também pela maioria, segundo as pesquisas de opinião. A comunidade científica denunciaria ao mundo o caos político de um golpe em meio a uma pandemia;

3) À reação e resistência da comunidade política democrática nacional, incorporaria-se a repulsa unânime da comunidade internacional, com países rompendo relações diplomáticas e comerciais;

4) A ditadura estaria isolada no continente, tendo no entorno um cinturão de países democráticos que de imediato repudiariam o golpe, pois veriam no  atentado à democracia brasileira um estímulo a aventureiros em seus países;

5) O golpe e a violência que o acompanha - fechamento de Poderes, perseguição política, prisões, torturas, mortes - legitimariam o surgimento de grupos armados de resistência, com possibilidade de apoio internacional, o que poderia levar o país a uma conflagração interna;

6) No caso de um golpe, o que Bolsonaro e seus generais fariam com o STF? Cassariam e prenderiam seus ministros? Substituiriam por quem e com quais critérios? E no MPF? E nos TJ estaduais? Cassariam os mandatos e prenderiam deputados e senadores? Cassariam os mandatos e prenderiam os governadores? Depois, enviariam todos ao exílio?

7) No poder total, por meio de um golpe, Bolsonaro e seus generais governariam sem o Congresso e por decreto? Favoreceriam a quem e por quais critérios nos cargos do governo de exceção? As investigações sobre a morte de Marielle, as rachadinhas na Assembleia do RJ, as milícias nas comunidades cariocas e a corrupção nos portos cariocas – em andamento pelas Polícias Civil e Federal – seriam arquivadas? Sem resistência?

7) Como Bolsonaro iria impedir protestos e manifestações públicas? Pondo o Exército para reprimir e prender sindicalistas, líderes comunitários, acadêmicos, estudantes...? Promoveria tortura e execuções de opositores, tendo o mundo e órgãos internacionais de direitos humanos de olho no BR?

9) Em um golpe, como Bolsonaro e seu séquito pensam que ficariam as relações com a França, Alemanha, Reino Unido, e China e Rússia, ou seja, o mundo democrático e os maiores parceiros comerciais do Brasil?

10) Em um golpe e ditadura, o que Bolsonaro faria com a Rede Globo/O Globo, a Folha de SP, o Estadão, Veja, Isto É, Carta Capital...? Faria a intervenção e estabeleceria a censura, sob protesto da mídia internacional, inclusive a norte-americana?

Bolsonaro teria dificuldade até de ter apoio de seu raro e maior aliado, o Donald Trump, que tem o seu país como epicentro mundial da pandemia Covid-19 e está em plena campanha pela reeleição presidencial nos EUA. Como Trump iria justificar aos americanos o apoio a um golpe de Estado contra uma democracia?

Pior para Bolsonaro seria ee o democrata Joe Biden for eleito presidente. Fatalmente haveria o repúdio e afastamento diplomático e comercial dos EUA. Além de tudo, se Bolsonaro se lançasse em uma aventura golpista, muito provavelmente estaria abrindo um racha nas FFAA brasileiras. Há democratas entre os militares.

Não há condições, mas vontade Bolsonaro, alguns generais e seus aliados fanáticos têm.

O país está no meio de uma pandemia, e o risco que existia - tendo o Brasil uma população majoritariamente pobre - é que a falta de renda e trabalho pudesse gerar saques, depredações, quebra-quebra, mas essa hipótese está anulada pelas medidas que o Congresso, o próprio governo federal e os governadores adotaram.

Mas, numa situação eventual dessas, as ações estão previstas na Constituição, dentro da democracia, como são os casos do Estado de Sítio e Estado de Emergência. Assim, por tudo, Bolsonaro não terá um soldado e um cabo para se aventurar em um delírio. Melhor pensar em governar para todos.

*Jornalista


Jornal de hoje

Por Angelo Castello Branco*

Lá na frente, quando a história será vista com mais isenção, teremos uma análise consistente do roteiro democrático protagonizado pelos presidentes José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luís Inácio da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro.

Trata-se de um script carregado de emoções e lances dramáticos pontuados pela morte de Tancredo Neves, tempos de inflação astronômica, de um ordenamento monetário, de escândalos, dois episódios de impeachments, prisão de um ex-presidente e um atentado a um candidato presidencial.

A história do Brasil na virada do século e nas duas primeiras décadas do século 21 exibe uma inegável tendência para a instabilidade política. A estabilidade é repetidamente ameaçada por tropeços constitucionais de certos governos.

A democracia foi conquistada a duras penas e ao longo de tortuosas negociações e confrontos que se estenderam por quase dois séculos. 

Hoje podemos dizer que as instituições democráticas em nosso país estão sólidas, mas os nossos líderes eleitos seguem confusos e metidos em trapalhadas.

O arcabouço democrático está montado, mas nos faltam pessoas com a superior dimensão de estadistas capazes de sistematizar o desenvolvimento mobilizando as riquezas e as potencialidades humanas, naturais e materiais que o Brasil tem de sobra.

Preferem se dedicar a disputas ideológicas em torno de modelos políticos superados há mais de meio século e sepultados pelo fracasso. Os conceitos modernos de gestão adotados no Primeiro Mundo não chegaram ainda por aqui.

O PT suprimiu a transparência no manejo de recursos públicos  transferidos para nações identificadas com o socialismo anacrônico e até submetidas a ditaduras. Os escândalos denunciados na Operação Lavajato, fartamente divulgados pela mídia nacional e internacional, puseram fim ao sonho da prometida “ética acima de tudo”.

Além disso, a leniência ante movimentos sociais que agrediam princípios da constituição causou reações e acirrou o debate ideológico. A figura do capitão Jair Messias Bolsonaro foi beneficiada pelas fragilidades e fracassos éticos de seus últimos antecessores.

Em 2018 o eleitor deparou-se com uma bifurcação eleitoral crucial. Ou optava por premiar o partido denunciado pela Lavajato, ou votava em Bolsonaro. Simples assim, nos dirá a história. O processo histórico alavancou a figura do capitão e lhe conferiu a vantagem que qualquer outro candidato teria ao chegar ao segundo turno das eleições de 18.

E como já era de se esperar, o novo presidente saiu cortando tudo o que se opunha aos seus discursos ideológicos, ferindo interesses e promovendo polêmicas como resultado de um temperamento conflituoso e um estilo incomum de falar à nação. Se vai dar certo ou não, só o futuro pode nos dizer.

*Jornalista



Página de impressão amigável Enviar esta história par aum amigo Criar um arquvo PDF do artigo
Publicidade Notícia