Regionais : Marty Baron: 'É preciso pagar para ter jornalismo de qualidade'
Enviado por alexandre em 02/07/2017 21:08:15


Trabalho de Baron serviu de inspiração para o filme "Spotlight".
Foto: Alice Vergueiro/Abraji
Maria Luiza Borges

Aposta forte em tecnologia, jornalismo investigativo e a busca de um modelo sustentável para as empresas de mídia em que os assinantes paguem pelo jornalismo de qualidade foram alguns dos temas abordados pelo editor executivo do jornal The Washington Post, Martin “Marty” Baron, cujo trabalho se tornou inspiração para o filme Spotlight, ganhador do Oscar em 2016. Baron falou no encerramento do Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), realizado de 29 de maio a 1º de junho na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo. A conversa foi mediada pelo jornalista Rosental Calmon Alves, diretor do Centro Knight, da Universidade do Texas.
Sustentabilidade

Baron acredita que a sobrevivência do jornalismo de qualidade está no modelo de assinatura paga. “Se as pessoas não pagarem pelo jornalismo de qualidade, elas não terão jornalismo de qualidade”, destacou. Ele imagina um modelo similar ao de um clube ao qual as pessoas querem pertencer. "Para salvar o jornalismo, é preciso dar suporte ao trabalho que fazemos", diz.

O Post pôde fazer grandes investimentos em tecnologia e também na contratação de pessoal graças a aquisição da companhia, há quase quatro ano, por Jeff Bezos, um dos homens mais ricos do mundo e criador da gigante de tecnologia Amazon. Dar força à tradicional marca de mídia e garantir que seja um negócio sustentável tem sido o objetivo declarado de Bezos. “Não somos uma obra de caridade. E estamos nos tornando uma empresa focada em tecnologia. Tecnologia e credibilidade são uma boa combinação para o nosso negócio", comentou. O editor também falou da sua relação com o chefe. “Temos uma reunião quinzenal, quando discutimos linhas gerais, mas Jeff nos dá completa independência ao Post”, atesta.

“Vivemos numa era digital, dominada pela mídia social e tecnologia móvel. E com a era digital surge uma forma totalmente nova de contar histórias, mais conversacional, usando ferramentas incríveis como gráficos interativos, vídeos, áudios, experimentos transmídia. O vídeo digital é completamente diferente do que faz a TV. E toda história que puder ter um vídeo deve ter um vídeo”, destaca esse senhor de 62 anos de fala calma e fama de sisudo.

Como ter sua história distribuída nas mídias sociais é outra preocupação, além de dar bons títulos que atraiam o público (isso já rendeu até insinuações de fazer clickbait). Ele explicou os testes A/B que o Post faz com as manchetes, ao pôr uma reportagem no ar com quatro diferentes títulos. Com base no interesse do público é que se decide qual título funciona melhor. “Nós não fazemos clickbait, fazemos histórias com bons títulos”, destacou.


Jornalismo investigativo

No quesito jornalismo investigativo, o Post (e o próprio Baron) são referência - embora Baron diga com humildade que não tinha a menor expectativa de que Spotlight, um “filme de escritório” ganharia o Oscar. Se ele inspirou o editor do filme sobre a descoberta do escândalo de pedofilia na Igreja Católica, o jornal The Washington Post foi tema do filme “Todos os Homens do Presidente", retratando o e escândalo Watergate, investigado por dois jornalistas do Post por quase dois anos e que terminou por derrubar o presidente Richard Nixon. O filme ganhou quatro Oscars em 1977. Este ano The Post volta a ser “protagonista” de Hollywood. O escândalo que ficou conhecido como Pentagon Papers, que revelou bastidores da Guerra do Vietnã, está sendo filmado por Steven Spielberg e terá Tom Hanks e Maryl Streep nos papéis principais. Baron disse no Congresso da Abraji que a expectiva é que seja lançado no final de setembro.

“Jornalismo investigativo faz parte da história do Post. Por isso ampliamos nossa unidade de jornalismo investigativo, de oito para 16 jornalistas”, destacou Baron. Ele citou trabalhos recentes do jornal, como a descoberta das falsas doações de caridade de Donald Trump, trabalho ganhador do Prêmio Pulitzer. O desafio é chegar às regiões conhecidas como Deep America (estados mais afastados do centro do poder e que foram os maiores eleitores de Donald Trump). “Nosso papel não é dizer ao país o que acontece em Washington. E dizer a Washington o que está acontecendo no resto do País”, falou. A Era Trump, que tem sido de muita turbulência entre o presidente e a mídia, Baron considera fascinante para um jornalista. “O presidente está empreendendo uma guerra contra a mídia. Mas a mídia não está em guerra com ele, está apenas trabalhando, fazendo seu papel”.

Baron falou de forma bem-humorada sobre a troca de farpas com o The New York Times. Depois que o editor executivo do NYT disse que o novo slogan do Post (“Democracia morre na escuridão”) parecia título do próximo filme do Batman, Baron respondeu, em uma entrevista: “O povo de Gotham não precisa pedir desculpas”. “Nós não somos rivais, somos competidores”, comentou Baron.

Outra aposta do Post é numa nova vertical focada na mulher da geração do milênio. Para isso, o Post lançou uma nova marca, The Lily, com design diferenciado e distribuição em diversas plataformas digitais: Medium, Facebook, Instagram, Twitter e newsletters. Uma equipe formada por seis mulheres faz uma curadoria do conteúdo gerado no jornal e reempacota sob a ótica feminina. Terá apenas anúncios nativos e já conta com um patrocinador exclusivo até o fim do ano. O nome é em homenagem ao primeiro jornal americano focado no público feminino, lançado em 1849 por Amelia Bloomer.

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