Brasil : PONTO DE VISTA
Enviado por alexandre em 14/08/2014 08:47:30


A Festa da Democracia no Brasil - Artigo

Heitor Toscano Henriques
Concluinte de Direito da UEPB

A expressão do título acima, comumente utilizada em ano eleitoral, é sintomática quando se trata da pouca preocupação do cidadão brasileiro (em sua maioria) com o sentido essencial de uma eleição.

A ladainha radiofônica e televisiva, diariamente, tenta nos convencer que nós devemos incorporar o espírito dessa grande "festa". Decerto, a democracia almejada para a nossa nação ainda não é aquela idealizada nos tempos em que vivíamos sob o jugo cruel da ditadura militar. Isso faz com que ainda haja muitas distorções quando o tema é política, eleições, candidatos e - principalmente - democracia.

Em pouco tempo de vida, a democracia brasileira viu um presidente sofrer impeachment (e voltar ao Congresso como Senador anos depois), um ex-operário alcançar o cargo de Chefe da nação e a primeira mulher presidente. Apesar de alguns retrocessos, avanços foram testemunhados, embora não sejam aqueles que se projetaram no marco zero. Natural de uma democracia pré-adolescente.

Sintomas nítidos dessa imaturidade são as cifras astronômicas alcançadas pelas campanhas dos candidatos, o trato da coisa pública como privada e , principalmente, um processo eleitoral de fazer inveja a qualquer micareta de Salvador. Felizmente, os tão afamados "showmícios" foram proibidos e os comícios e eventos partidários tem hora marcada para acabar. Neste aspecto, algo mudou positivamente. Mas ainda falta muito.

Particularmente, admiro o trabalho dos criadores de jingles (os decentes, claro). Não se pode culpar estes e nem os marketeiros, afinal eles estão ali pra isso. São pagos para fabricar sonhos. No entanto, aí reside nosso grande mal. Nossa tradição festiva nos induz quase que instintivamente a entrar nessa onda da tal "festa" da democracia. Resultado: um pleito eleitoral a cada dois anos que enfeia nossa cidade, pertuba nosso sossego e, no final das contas, não nos apresenta em volume suficiente as propostas que tanto esperamos.

Os carros de som, tão arcaicos quanto alguns dos candidatos que deles se valem, são o símbolo do desrespeito com o cidadão, e quase dizem, metaforicamente: "ganharemos a campanha no grito". Ensurdecedor.

Os panfletos/santinhos são outra forma medieval de se fazer campanha, e no dia da eleição são a representação do antigo cabresto: "Tá aqui. Pra você não esquecer do número".

O arrastão é o pastiche malsucedido daquilo que entendo ser o verdadeiro "povo na rua". Nesses movimentos, não há causa, não há luta. Há sim, uma catarse coletiva alimentada pela idolatria a uma cor/candidato e, claro, por uma barulheira comandada por trios elétricos, tal qual um carnaval fora de época.

Seria utopia imaginar que no Brasil se reproduzissem os "meetings" (encontros) norte-americanos, nos quais os candidatos se reúnem em um auditório público para apresentar propostas de maneira sóbria e os eleitores estão sentados com suas mini-bandeiras, ouvindo atentamente qual é a plataforma de governo em pauta. Seria utopia - também - imaginar a política brasileira distanciada da emoção. Toda causa verdadeira precisa desse combustível para alcançar resultados.

Os questionamentos que precisam ser feitos, no que tange ao nosso processo eleitoral, se centram nos gastos excessivos, na massificação de imagens sem conteúdo, na pertubação do sossego, no impacto visual urbano e na pouca preocupação dos candidatos em criar meios alternativos para divulgar propostas (se essas realmente existirem). Na era das redes sociais, muitos possuem perfis, mas estes só servem pra estampar fotos com o número de sua legenda, renegando-se instrumentos poderosos de divulgação de propostas e de captação delas.

Caso não se pense mudanças neste sentido, continuaremos votando em refrões de jingles, pulando em arrastões e envelopando carros, legitimando a tal medíocre expressão "festa da democracia". Da falsa democracia.

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