
MEMÓRIA
Data 16/08/2015 18:47:04 | Tóopico: Brasil
|  Cuba a Olha de Fidel Castro vale a pena conhece-la Numa série de reportagens em 2001 mostrei as minhas impressões sobre Cuba, que conheci numa viagem acompanhando a delegação do então ainda pré-candidato à Presidência da República, Luis Inácio Lula da Silva. À primeira vista, Cuba parece parada no tempo. Havana, com dois milhões de habitantes, choca pela deterioração de grande parte da cidade. Mesmo áreas rurais de rara beleza e boa qualidade de vida, como Pinar del Rio e Vinhales, nos dão a impressão de viagem ao passado.
Havana é pobre, mas tem o charme de seu patrimônio histórico-arquitetônico, a mística do duelo de Cuba com o gigante americano, com quem fez as pazes recentemente e, sobretudo, com a simpatia de seu povo. Todos têm habitação, ainda que precária, alimentação básica, educação e assistência médica.
Isso, ainda hoje, dá uma visão do “paraíso”, mas não existe acesso aos direitos essenciais. Produtos básicos de limpeza, de higiene pessoal e comida são artigos de luxo em Cuba. Viajando de leste a oeste da ilha, o que vi foi uma nação em colapso. Mercado negro, sonegação, corrupção, prostituição, malandragem e jeitinho são moeda corrente no país.
A economia é tão complexa que até a mais brilhante inteligência teórica teria dificuldade de entender seu funcionamento. Longe do turismo requintado e das estatísticas oficiais do governo, as dificuldades da população se aprofundaram com o fim da Guerra Fria. Com a suspensão da ajuda da União Soviética, no início dos anos 90, foi imposto o período especial, marcado principalmente por um severo racionamento de energia.
A nação começou a se deteriorar. O salário que os cubanos recebem é o mesmo de sempre, mas antes pagava todas as contas do mês. Agora não paga. O Partido Comunista de Cuba teve de encarar o problema e, sem saída, abriu timidamente a economia para o capital estrangeiro. A abertura da economia gerou empregos e atraiu capital estrangeiro para a maior e mais charmosa ilha do Caribe. Mas não melhorou a vida da maioria do povo.
A cesta básica de alimentos distribuída pelo Governo dura apenas uma semana. Para garantir o sustento para o resto do mês, os cubanos precisam fazer bicos. Os pesos só podem ser gastos em poucas lojas e em mercados públicos que vendem o mínimo do básico: arroz, feijão, açúcar, sal, café, cigarro, palito de fósforo, alguns legumes e pouca coisa a mais. Mesmo assim, a quantidade é limitada por pessoa.
Outros artigos de primeira necessidade são destaque nas lojas - rolos de papel higiênico, panelas, recipientes plásticos, lamparinas, panos de chão são exibidos na vitrine. Produtos que no Brasil ficam escondidos no fundo da loja. Existe um comércio paralelo, movimentado por pequenos furtos feitos por operários das fábricas, funcionários de armazéns estatais ou empregados de lojas. A opção pela ilegalidade é involuntária. Não tem saída.
A prostituição, um dos temas da reportagem que fiz, é visível nas ruas e nos hotéis de luxo. Prostitutas e gigolôs se misturam com hóspedes e músicos cubanos. A polícia assiste a tudo sem interferir. Todos levam um bom dinheiro nessa história. As prostitutas "classe A", como dizem os cubanos, podem ganhar até 100 dólares por cliente.
A maior parte do dinheiro fica com o gigolô, que compra roupas e maquiagem para suas moças e paga um pedágio à polícia para poder tocar o negócio. A todo momento somos abordados nas ruas por algum cubano oferecendo tabaco muito em conta, uma "jinetera", como são chamadas as prostitutas, drogas e até balas e bombons.
O furto já é uma atividade institucionalizada em Cuba. O comércio ilegal de tabaco, um dos principais itens de exportação do País, é dos mais visíveis. Muitos cubanos obtêm o sustento da mesma forma. Como em qualquer lugar do mundo, a ilegalidade rende muito dinheiro. O charuto Cohiba, marca famosa criada pelos revolucionários, é vendido a 385 dólares a caixa de 25 unidades na loja da fábrica, em Havana.
Dez vezes mais caro do que é cobrado nas ruas, cuja procedência é duvidosa. Em Cuba, o turista é bem tratado porque representa o caminho mais curto para chegar ao dólar. Também não há arma de fogo. Esse é um aspecto positivo de Cuba. Não há assaltos, só pequenos furtos. Arma é proibida, nem no mercado negro se pode encontrar um revólver. O Código Penal é muito rígido.
Os cubanos preferem ficar longe da criminalidade mais pesada. É agradável, ainda, ver crianças calçadas e vestidas decentemente. Todas estão na escola, sem exceção. Mão-de-obra infantil também não se vê. As crianças têm tempo para se divertir jogando bolinha de gude e beisebol nas ruas.
O estudo é obrigatório, e os pais que desobedecem à lei são multados. Ao contrário do que se imagina, porém, a escola não é totalmente gratuita. Custa 40 pesos mensais para o ensino primário, cerca de 20% do salário médio cubano. Também surpreende o fato de que não há vagas suficientes nas universidades. Há um teste de seleção, como o vestibular no Brasil.
A saúde é para todos, mas o acesso é burocratizado. Tem gente que não consegue ser operada por falta de médico, equipamento cirúrgico, leito ou qualquer outro problema. Os cubanos reclamam, principalmente, da falta de medicamentos. Muitos pensam em deixar o País e já não é mais preciso recorrer a um bote improvisado para atravessar os 120 quilômetros que separam a ilha da Flórida, nos Estados Unidos, onde vivem mais de 1 milhão de cubanos, cerca de 10% da população.
O governo não proíbe a saída para maiores de 18 anos, mas é difícil um cubano conseguir um visto permanente fora de casa. O governo permite o matrimônio de cubanos com estrangeiros residentes em Cuba, mas cobra alto pela concessão, 800 dólares. A conta ainda inclui a tarjeta branca, autorização para um cubano sair do país (150 dólares), passaporte (50 dólares) e passagem aérea (400 dólares).
Isso sem considerar o preço que um estrangeiro pede para casar-se, cerca de 500 dólares. A soma total chega a quase 2.000 dólares. Quanto ao turismo, enfim, a parte final da minha série, vale a pena ir a Cuba. Logo de início, a impressão negativa é a de sujeira, com a falta de revitalização de edifícios e vias.
De qualquer forma, os prédios e carros antigos e os “bicitaxis” (bicicletas com lugares para o passageiro na parte de trás), somados à maresia, dão à capital cubana um ar único. Entre as paradas obrigatórias está o Museu da Revolução e o Malecón (avenida beira-mar). Na capital também é possível visitar tradicionais fábricas de charutos e comprar rum de ótima qualidade.
Um dos passeios que costumam ser procurados pelos viajantes é o que leva às montanhas de Sierra Maestra, onde Fidel Castro comandou guerrilhas no final dos anos 1950. Outra cidade bastante popular é Santiago de Cuba, mais ao oriente da ilha, conhecida por festivais de música e uma vida agitada.
MAGNO MARTINS
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