Justiça : COTADO AO STF
Enviado por alexandre em 14/06/2020 23:26:45

Ivan Sartori minimiza críticas ao governo e diz que boa parte do Judiciário apoia Bolsonaro

Por Frederico Vasconcelos, da Folhapress

SÃO PAULO – O desembargador aposentado Ivan Sartori, 63, ex-presidente do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), no biênio 2012/13, vestiu a camisa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) muito antes das eleições de 2018.

Seu voto pela absolvição de 74 réus do massacre do Carandiru, invocando a tese da legítima defesa, o aproximou em 2016 do capitão e de seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro.

Sartori é o terceiro nome numa lista de possíveis indicados para ocupar a vaga de Celso de Mello, que se aposentará em novembro do STF (Supremo Tribunal Federal). Ou a carta que o presidente guardaria na manga, segundo apostas isoladas.

“É mera especulação”, diz o pré-candidato a prefeito de Santos (SP).

Nesta entrevista, ele avalia o bolsonarismo no Judiciário e minimiza as críticas ao governo. “O fato de uma ou outra associação [de juízes] lançar nota contra o presidente não reflete, de jeito nenhum, uma posição majoritária”, diz Sartori.

Em nota, o presidente do TJ-SP, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, repudiou os ataques de autoridades públicas ao Supremo. Magistrados alertaram para “aventuras antidemocráticas” estimuladas pelo presidente da República. Manifesto de advogados, membros do Ministério Público e profissionais do direito condenou a “ação genocida de Bolsonaro”.

Nas redes sociais, Sartori defende Bolsonaro e diz que a Covid-19 não pode parar o país. “Sempre fui favorável a uma quarentena vertical, com campanhas de convencimento e arregimentação de líderes comunitários”, afirma.

Sua gestão no tribunal paulista foi encerrada, em dezembro de 2013, com elevado índice de aprovação por magistrados e servidores.

Ao assumir, em 2012, mandou investigar irregularidades antecipadas pelo jornal Folha de S.Paulo. Confirmou a existência de uma folha de pagamentos paralela, que beneficiava um grupo desembargadores.

Sartori abriu o tribunal à fiscalização do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Foi elogiado por Eliana Calmon: “O tribunal destravou sob sua regência”, disse a ex-corregedora nacional.

Tentou a reeleição, pretensão barrada pelo CNJ. Foi homenageado várias vezes pela Polícia Militar de São Paulo. No final da gestão, criou e distribuiu medalhas.

Mas na eleição do sucessor, José Renato Nalini, perderam os candidatos mais afinados com Sartori, cuja atuação midiática tinha restrições entre desembargadores mais antigos.

Em 2014, Sartori encabeçou a lista de magistrados interessados numa vaga no Superior Tribunal de Justiça. Não foi o escolhido. Dois anos antes, negou ter feito campanha em Brasília para obter apoio político a uma indicação ao Supremo Tribunal Federal.

A entrevista foi realizada por e-mail.

Pergunta – O que o levou a apoiar o presidente Jair Bolsonaro?

Ivan Sartori – Evitar que o PT continuasse no governo, tamanho os desmandos que esse partido praticou.
Quando houve essa aproximação?

IS – A aproximação se deu quando Eduardo [Bolsonaro, deputado federal pelo PSL-SP] pediu que eu estruturasse o PSL em Santos, embora eu me mantivesse no PSD.

Antes, o presidente [Jair Bolsonaro], então deputado, e Eduardo haviam gravado um vídeo enaltecendo a Câmara do TJ-SP em que eu oficiava, pela decisão no caso Carandiru. Fiz a estruturação, mas, depois, o presidente saiu do partido, que tomou outro rumo aqui em Santos.

Entre as pessoas próximas ao presidente, com quem o sr. mais dialoga?

IS – Conheço mais o Eduardo. Falamos pouco, só quando há algo de especial, como foi o caso da estruturação do PSL ou, sem qualquer compromisso, quando houve notícias de que meu nome estaria sendo cotado para ministro da Justiça.

O sr. foi a Brasília quando o então ministro Sergio Moro deixou o cargo?

IS – Prefiro não falar sobre isso. A situação já passou e o novo ministro já está no cargo, tratando-se de pessoa gabaritada.

O sr. chegou a ser sondado para algum cargo em Brasília?

IS – Concretamente não, embora tenha mantido alguma conversa com pessoas do gabinete de transição, no campo das ideias, isso naquela época da posse do novo governo.

Como a magistratura avalia a sua opção de apoiar Bolsonaro?

IS – Eu apoio, na verdade, o presidente da República eleito pelo povo brasileiro. Não se trata, portanto, da pessoa, mas, de quem foi escolhido pelo povo. Penso que a Constituição deve ser respeitada. É o que defendo.

Qual o apoio que o sr. tem entre juízes para uma indicação ao STF? Há alguma resistência?

IS – Quanto a essa questão de que eu estaria cotado para o STF, nada posso dizer, porque nada me foi passado ou comunicado a respeito. É mera especulação. Não fiz uma sondagem a respeito. Mas, pelas manifestações que recebo, há, sim, uma aprovação.

Qual o peso do bolsonarismo no Judiciário?

IS – Não sei dizer. Mas, sei que boa parte da magistratura o apoia, sem que isso, porém, tenha qualquer reflexo na atividade jurisdicional. O fato de uma ou outra associação lançar nota contra o presidente não reflete, de jeito nenhum, uma posição majoritária.

No Supremo, pelo acontecido, ele encontra algum antagonismo, considerados o inquérito seletivo das fake news e aquele sobre alegada interferência na Polícia Federal, dada a postura dos ministros relatores.

O sr. acha correto o tratamento que o governo federal dá à pandemia?

IS – O governo, nessa pandemia, é apenas um provedor, já que o STF, afastando o sistema federativo, passou aos estados e aos municípios a responsabilidade a respeito. Portanto, nada se pode falar sobre ação governamental federal.

Eu, particularmente, sempre fui favorável a uma quarentena vertical, com campanhas de convencimento e arregimentação de líderes comunitários. Jamais, a horizontal e pelo meio da força, como vem ocorrendo, com prejuízo das garantias constitucionais.

A economia do país, ademais, não suporta tamanha paralisação. Cumpram-se os protocolos da pandemia, mas, sem estagnação.

O sr. acredita numa democracia militar?

IS – A situação é hipotética. Eu prestigio a democracia, o voto popular. Nem poderia ser diferente. Apenas com a participação do povo é que se pode atender aos interesse da população e se chegar ao bem comum.

Como vê a relação da Polícia Militar com o Poder Judiciário nos estados?

IS – Vejo que existe um bom relacionamento, como deve acontecer nas relações entre quaisquer instituições públicas. É preciso mesmo que haja um entrosamento, na medida em que a atividade jurisdicional, para ter efeito concreto, depende, não raro, das forças de segurança.

Como avalia a independência das PMs em relação aos governadores, e os casos de vinculação direta com o bolsonarismo?

IS – Os governadores são os chefes superiores das PMs. Então, a independência é restrita, mesmo porque os comandantes gerais são nomeados pelos governadores e o cargo é de confiança, sucedendo possível alteração, a critério do governador.

Aliás, essa situação de dependência fica mais clara aqui em São Paulo, quando vem correndo a notícia de que [o governador João] Doria está perseguindo policiais que manifestam ideologia ou posição política diversa da dele. Tenho recebido inúmeras reclamações a respeito.

A absolvição dos réus do massacre do Carandiru aumentou seu cacife junto a militares?

IS – Como magistrado, me limitei a um julgamento técnico. Meu voto tem 100 laudas e elementos probatórios suficientes. O juiz decide não para agradar ou ser simpático, mas, para cumprir um dever seu de forma técnica e isenta. É possível, no entanto, que militares tenham aprovado a decisão.

O sr. endossa os elogios a torturadores?

IS – Evidente que não. Eu sou um homem liberal, respeitador dos direitos humanos e dos princípios democráticos. Basta ver minhas decisões nos 38 anos em que fui magistrado. Também, à frente do TJ-SP, mais voltei os olhos para os funcionários.

Tenho preocupação acentuada com os hipossuficientes, a miséria e as agruras por que passa a maioria dos brasileiros.
Apenas, não posso concordar com a crítica cega aos órgãos de segurança, ainda que abusos possam ocorrer e devem ser apurados.

O caso Carandiru foi deturpado pela imprensa, um filme fantasioso e militantes interessados em causas que não a paz social. Houve falhas ali? Sim. Mas, havia uma rebelião de grandes proporções, num dos maiores presídios da América Latina, que poderia chegar a um dano social impensável, diante do número de presos que havia ali.

A população corria sérios riscos. Quem se entregou nada sofreu. No embate, porém, policiais precisaram se defender, diante da estratégia de ataque do presos. Também obedeciam a ordens.

O sr. deixou o TJ-SP com grande popularidade entre os servidores. Continua recebendo esse apoio?

IS – Sim. Os servidores, em regra, reconhecem que a gestão, em muito, foi voltada para a classe, o que, por sinal, levou a um aumento de cerca de 20% na produção.

Há críticas sobre a forma como o sr. se manifesta em relação às posições dos juízes. Transmitiria a ideia de que, aposentado, ainda tem alguma ascendência sobre magistrados.

IS – Eu apenas manifesto meu posicionamento. Nenhuma é minha ascendência ou pretensa ascendência sobre juízes. Nem a tinha quando presidente do Tribunal, pois a autonomia do magistrado na função jurisdicional é inerente a esse mister. Somente acho que o Judiciário vem invadindo, em muito, as atribuições constitucionais do Executivo e, na maioria das vezes, por provocação do Ministério Público.

Hoje, prefeitos, governadores e o próprio Presidente vêm encontrando dificuldades acentuadas no desempenho do cargo, tantas as interferências judiciais. Há muito, os prefeitos se queixam disso. Não conseguem governar, administrar.

O Ministério Público, com o beneplácito do Judiciário, acaba substituindo indevidamente o administrador em situações que não caberia.

Sua gestão no TJ-SP foi marcada por transparência e diálogo. Como avalia a atual gestão do TJ-SP? O que teria feito diferente?

IS – A gestão atual do TJ-SP está no início e tenho prognóstico de que será excelente, pelas virtudes, cultura e discernimento do presidente Geraldo [do tribunal, Francisco Pinheiro Franco], meu colega de concurso, homem experiente e preparado para o cargo. O Conselho Superior conta com integrantes do mesmo nível.

Apenas auguro que haja uma orientação, sem vinculação, lógico, no sentido de que o Judiciário, principalmente nas comarcas, interfira menos no Executivo. Evidente que atos criminosos, de improbidade não podem ser tolerados. Mas, não se pode fazer as vezes do Executivo, como vem ocorrendo.

Qual a importância da disputa pela prefeitura de Santos?

IS – É a cidade em que vivo há quase trinta anos e amo! A princípio, não imaginava e nem queria ser pré-candidato à prefeitura. Foi difícil eu me acostumar com essa ideia. Pretendia advogar e me dedicar ao lazer com a família. Mas, muitas pessoas e partidos vieram até mim, diante da gestão positiva que implementei no TJ-SP. Acho que é nossa obrigação, quando possível, participar da vida pública, fazer algo de bom, especial para a população.

Quais são os seus projetos de curto e longo prazos?

IS – Agora, é levar avante essa pré-candidatura. Depois, só Deus sabe.

Gostaria de fazer algum comentário além das questões apresentadas?

IS – Almejo que haja paz e harmonia entre os Poderes, governos federal e estaduais, o que se desenhava a partir de reunião recente e exitosa, mas, acabou prejudicada por conta, muito, da publicização do tal vídeo da reunião ministerial.

O Brasil precisa seguir, principalmente porque a maioria da população é miserável e carente de políticas públicas. Preocupa-me de onde virão os recursos no pós-pandemia, diante das inúmeras empresas falidas, extintas e do desemprego em massa advindos da paralisação.

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