Política : CAIXA
Enviado por alexandre em 20/01/2018 19:47:43


Temer não conhece pormenores da investigação

Polícia Federal sustenta que executivos afastados do banco público favoreciam a base aliada de Temer, incluindo políticos do PR, PRB, PP e PMDB.

Veja - Redação

O presidente Michel Temer disse que levou quase dois meses para afastar os quatro vice-presidentes da Caixa Econômica Federal envolvidos em desvios que vão desde facilitação de financiamentos bilionários em troca de propina até recebimento de favores pessoais simplesmente porque desconhecia o comunicado feito pelo Ministério Público Federal ao Palácio do Planalto. “Não recebi nenhuma comunicação. Foi um ofício ao chefe da Casa Civil que, por sua vez, encaminhou ao Ministério da Fazenda, que encaminhou à Caixa. Essas coisas você não faz a toque de caixa”, justificou o presidente em entrevista ao jornal Folha de São Paulo publicada neste sábado, 20. “Quando me chegou aos ouvidos que o Banco Central havia recomendado o afastamento, tomei a cautela de afastá-los para que o Conselho da Caixa possa examinar o assunto, dando-lhes o direito à ampla defesa”, concluiu.

Segundo investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, os quatro vice-presidentes foram indicados para os cargos por partidos políticos da base governista (PR, PRB, PP e PMDB) de Temer, muito embora eles sejam funcionários de carreira da instituição.

Procuradores que acompanharam as investigações chegaram a enviar um segundo ofício afirmando que o presidente poderia ser responsabilizado, na esfera cível, por ilícitos que eventualmente viessem a ser cometidos pelos 12 vices que a Caixa mantém em seu organograma. Só depois desse alerta o presidente voltou atrás e decidiu afastar apenas quatro vice-presidentes investigados: Antônio Carlos Ferreira (Corporativo), Deusdina dos Reis Pereira (Fundos de Governo e Loterias), Roberto Derziê de Sant’Anna (Governo) e José Henrique Marques da Cruz (Clientes, Negócios e Transformação Digital). Temer não justificou esse recuo, mas arrumou uma desculpa para justificar porque não os afastou imediatamente. “Não conhecia os pormenores da investigação. Como confesso que não conheço até hoje. Na minha função, não consigo acompanhar caso por caso”.

Temer rebateu também a afirmação do vice-presidente afastado da Caixa, Roberto Derziê de Sant’Anna, encarregado da relação do banco com o governo, que disse em auditoria que recebia pedidos de favores do próprio presidente e do ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência). “Em primeiro lugar, jamais, grife jamais, e coloque em sua cabeça em letras garrafais, pedi coisa de emenda ou dessa natureza. O Derziê conheço formalmente, não tenho relação pessoal. Eu jamais fiz nenhum pedido”, garante.

O afastamento dos quatro executivos da Caixa são apenas a ponta de uma investigação complexa que corre sob sigilo no seio da instituição. O Ministério Público Federal e a Polícia Federal mantém em diversos setores do banco três operações em pleno funcionamento: A Greenfield, que investiga desvio de recursos de fundos de pensão de bancos públicos e de estatal; Sépsis, que apura a liberação de recursos do Fundo de Investimentos do FGTS (FI-FGTS) em troca de propina; e a operação Cui Bono, que tenta estancar fraudes na liberação de créditos da Caixa em troca de propina.

Na entrevista, o presidente também comentou o polêmico encontro que teve com o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segóvia, às vésperas de entregar as respostas para 50 perguntas feitas por investigadores que apuram irregularidades em portos envolvendo o próprio Temer. “Eu discuti sobre segurança pública. O que me surpreende é que o presidente não pode falar com o diretor-geral da Polícia Federal. Como se fosse criminoso. Eu já estava com as perguntas respondidas. São tão desarrazoadas, singelas, simplórias que não tinha nenhuma preocupação”

Caixa de surpresas



André Singer – Folha de S.Paulo

A ex-presidente Dilma Rousseff foi impedida, de maneira ilegítima, como se sabe, pelo "conjunto da obra". Nunca ficou provado crime de responsabilidade e, muito menos, corrupção. Ao contrário, foi Dilma quem mudou, em 2012, a diretoria da Petrobras, depois implicada na Lava Jato.

O impeachment adquiriu tons de eleição indireta, com o candidato ao cargo, Michel Temer, cabalando votos para chegar lá. Quantos não votaram contra Dilma em nome da moralidade? Compare-se agora a atitude de Temer com relação à diretoria da Caixa Econômica Federal (CEF), acusada das mesmas práticas que havia na estatal do petróleo (favorecimento em troca de recursos). Enquanto Dilma demitiu, Temer faz o possível para manter. Esperemos que o novo estatuto, aprovado nesta sexta-feira (19), impeça o seu êxito.

Diga-se em favor de Temer que apenas cumpre as regras do jogo político real, diferentemente daquelas que vigoram no mundo das leis. Os partidos que indicaram os implicados condicionam os votos na Câmara à retenção de vagas na instituição financeira. Incrível é que o façam com tamanha naturalidade quatro anos depois de iniciada a Lava Jato.

Parte da diretoria é remanescente daquela que a Polícia Federal investiga, publicamente, há um ano. No começo de 2017, a PF deflagrou a Operação Cui Bono? (Quem ganha?), para vasculhar um esquema de fraudes na liberação de créditos da CEF. Principal suspeito? Geddel Vieira Lima, que teria atuado em parceria com ninguém menos que Eduardo Cunha, ambos presos.

Em outubro passado, o doleiro Lúcio Funaro falou, em colaboração premiada, a respeito do caso. Afirmou que um dos vices da época tinha "meta mensal" de propina a distribuir para os políticos do seu partido. O que fez Temer, acusado pelo doleiro de conhecer o esquema? Transformou o mencionado vice em presidente do banco.

Em detrimento de Dilma, é preciso reconhecer que Geddel foi vice-presidente da instituição entre 2011 e 2013, durante o primeiro mandato da petista. Talvez consistisse no preço —que se mostrou inútil pagar— para manter algum equilíbrio na Câmara. Questão para os historiadores.

Em recente entrevista, Pedro Corrêa, ex-presidente do Partido Progressista (PP) condenado na Lava Jato, afirmou que esse tipo de esquema existe desde o Império. Sabe do que fala. O trisavô foi presidente do Banco do Brasil e das Províncias do Maranhão e de São Paulo. Quase dois séculos depois, não vai desaparecer tão cedo.

Por surpreendente que seja a boa parte do público, ocorreu aqui o mesmo que na Itália. A Mãos Limpas destroçou o sistema partidário e provocou a ascensão de figuras piores. Temer é o nosso Berlusconi.

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