Regionais : Setor de figurantes da PF roubou (ops) a cena
Enviado por alexandre em 23/10/2016 11:45:26

Setor de figurantes da PF roubou (ops) a cena


Blog de Josias de Souza

Sergio Moro declarou no início do ano que a ''Lava Jato não é seriado de TV, que tem que ter capítulo toda semana.'' Hoje, porém, a operação produz capítulos numa profusão típica de novela diária. A plateia, cada vez mais familiarizada com os personagens, aplaude o desempenho do juiz-protagonista e dos coadjuvantes do núcleo de investigação. Vibra com as prisões de Cunhas e Paloccis. E se diverte com o núcleo de figurantes da Polícia Federal, cujo papel parece ser o de injetar uma dose de comédia na tragédia.

Nos últimos dias, descobriu-se que Newton Ishii, o ‘Japonês da Federal’, livrou-se de sua tornozeleira eletrônica mais cedo do que o previsto. Tomado pela ficha funcional, Ishii está mais próximo dos vilões que escoltou até a carceragem de Curitiba do que do quadro de servidores da PF. Em 2003, foi preso por colegas acusado de facilitar a entrada de contrabando na fronteira com o Paraguai. Amargou dois meses de cana. Condenado, recorreu.

Ishii saiu da PF e reintegrou-se à instituição. Em março passado, o STJ confirmou sua condenação: quatro anos e dois meses de cadeia, no regime semiaberto. Ganhou tornozeleira. Mas não perdeu o emprego. Aliviou o tornozelo porque, a cada três dias de expediente na PF, subtraiu um dia com o adereço eletrônico.

No Carnaval, as máscaras de Ishii fizeram concorrência às de Sergio Moro. Depois da condenação, a diversão confundiu-se com avacalhação. Súbito, o departamento de figurantes da PF escalou outros agentes para conduzir os vilões da Lava Jato até a República de Curitiba. Nesta semana, irrompeu em cena Lucas Valença, uma mistura de ‘hipster’ com lenhador. Virou subcelebridade instantânea depois de conduzir Eduardo Cunha pelo braço. Bombou no Facebook e no Instagram, onde aparece de torso nu. O sucesso levou-o a veicular um vídeo neste sábado. Termina assim:

''Queria agradecer a todo mundo que está seguindo e mandando mensagem de apoio, de carinho, e dizer que, realmente, estou honrado de ter participado desse momento histório. É isso aí. Valeu.''

Pessoas que fazem história nem sempre têm uma sensibilidade à altura dos seus feitos. Ou têm, mas não conseguem expressá-la. Considerando-se a frequência com que o departamento de figurantes da PF vem roubando (ops!) a cena na Lava Jato, o comando da institução deveria reservar uma verba para a contratação de dublês.

Assim como existem os dublês que substituem os atores nas cenas de perigo, deveria haver intelectuais para substituir os agentes da figuração na hora de expressar emoção. Eduardo Cunha está longe de ser o detento mais importante da novela. Prisões mais notáveis estão por vir.

No quesito aparência, o Lenhador da Federal cumpre bem o seu papel. Mas há momentos em que a boa frase é essencial. De duas, uma: ou a PF restabelece a compostura, devolvendo o setor de figurantes à insignificância de praxe, ou providencia alguém com menos tórax e mais reflexão para substituir o lenhador na hora em que ele tiver que se deslumbrar com os grandes momentos que estão por vir.


Eduardo Cunha ainda é um célebre desconhecido



Janio de Freitas - Folha de S.Paulo

Eduardo Cunha ainda é um desconhecido. Não só do público que se gratifica com sua prisão. Mesmo do jornalismo, dos que se intitulam cientistas políticos, da polícia até, como da Justiça. A esses setores que têm a atenção por ofício, porém, Eduardo Cunha não negou oportunidades desde a sua primeira fatia de poder de influência.

Jovem presidente da Telerj, originário do gabinete de Abi-Ackel, ministro da Justiça de Figueiredo, com passagem pela campanha de Collor como auxiliar de PC Farias, Cunha não demorou a introduzir uma novidade muito apreciada. Entre os custos da telefônica, incluiu uma quantidade progressiva de pagamentos mensais, a destinatários fixos e com a peculiaridade de nada fornecerem à empresa.

As inquietações da moeda dificultam a citação de valores. Mas não inferiorizam a ideia de que mesmo hoje seria alta a verba dada, mês a mês, a cada um dos deputados admitidos à gentileza. Seria injusto com Eduardo Cunha e com os deputados restringir essa cadeia da felicidade a políticos. O segmento da comunicação teve também o seu reconhecimento, com uma corrente de jornalistas, pessoal de TV e rádio, sem discriminação contra alguns dirigentes e mesmo proprietários. Eduardo Cunha e a Telerj promoviam a melhoria da renda per capita.

A interrupção do governo Collor deixou sobrevida pequena a Eduardo Cunha no meio oficial, durante o governo Itamar Franco. Mas sua ascensão na iniciativa privada, e põe iniciativa nisso, não foi menos veloz. Eduardo Cunha aproximou-se de Jorge Serpa, expoente, por décadas, em intermediação do poder econômico com o poder político. Não é lobby, é uma atividade em altos níveis, no mundo sigiloso, quase sempre para procedimentos que contornem as vias e soluções convencionais em negócios.

Basta um episódio para bem ilustrar a nova escala de Eduardo Cunha. Jorge Serpa e ele foram os principais criadores da nomeação, muito improvável, de um novo desembargador federal. Era um ex-assessor de Cunha, como advogado do departamento jurídico da Telerj. Ao desembargador ficou atribuída, no mundo dos sigilos, a rota misteriosa em que entrou o processo protagonizado por Eduardo Cunha e pelo doleiro argentino Jorge La Salvia, ex-procurador de PC Farias em determinadas transações.

O processo resultou da constatação de práticas originais na Cehab, presidida por Cunha no governo Garotinho. Uma dessas criações consistiu em negociar com cartórios a realização das escrituras referentes aos terrenos e a 140 mil moradias. Os compradores perdiam o desconto, dado a pessoas de renda baixa, outros o recebiam, e ainda havia o pagamento do cartório pela escolha. La Salvia, como o colega brasileiro, apareceu depois em mais inquéritos.

Eduardo Cunha não faltou, também, a quem preferisse assunto mais propriamente policial. Genro, em seu primeiro casamento, do coronel Dytz –um daqueles tantos coronéis que povoavam os palácios no governo Figueiredo, Dytz para comprar e vender cavalos do general– Cunha teve à época uma vida familiar conflituosa. Na qual não faltou sequer uma arma de fogo em sua mão. Com a afirmação logo corrente, e não encontrada em noticiário algum, de que sua então mulher estava ferida, diziam, em uma perna.

Eduardo Cunha é um desconhecido, inclusive, da Lava Jato. Foram bloqueados R$ 220 milhões seus. Em junho. Desde então, não acharam um centavo que fosse bloqueável. A Lava Jato diz que o dinheiro de Eduardo Cunha equivale a 53 vezes o declarado ou identificado. Ninguém, a não ser o próprio, sabe quanto Eduardo Cunha tem, em que lugares está distribuído o que tem, e que bens possui. É o desconhecido, afinal

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